As arboviroses são doenças causadas por vírus denominados arbovírus, que são transmitidos aos animais vertebrados, incluindo o homem, por meio de vetores artrópodes como, os mosquitos.

No Brasil, as arboviroses que chamam mais a atenção são: Dengue, Zika, Chikungunya e Febre Amarela. Mas, recentemente, outras duas doenças vêm ganhando destaque: Mayaro e West Nile. De acordo com o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, em 2019 foram notificados 1.527.119 casos prováveis de dengue, 130.820 de Chikungunya e 10.741 de Zika.

Durante o 53º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (CBPC/ML), que ocorreu no Rio de Janeiro, o tema foi abordado em uma conferência magna conduzida por um dos maiores especialistas do mundo em arbovírus, o professor Dr. Pedro Vasconcelos, médico virologista e atual presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT).

Diante da grande incidência das arboviroses no Brasil e no mundo, um problema de saúde pública que preocupa a comunidade científica, torna-se importante compreender as novas descobertas a respeito dessas doenças. Acompanhe neste artigo da Labtest a situação das arboviroses no Brasil e o porquê de serem tratadas como uma questão de saúde pública.

Arboviroses no Brasil

“Os arbovírus são transmitidos no meio urbano, principalmente, pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus. Há mais de 500 espécies catalogadas desses vírus e, dentre elas, mais de 100 causam doenças em humanos”, explica Bárbara de Morais, especialista de produtos Labtest.

No Brasil, ocorreram epidemias de Dengue em 2015, Zika em 2016, Chikungunya em 2017 e o retorno da Febre Amarela em 2018. Em 2019, os casos de dengue aumentaram 488% em relação a 2018, com 754 óbitos confirmados e 221 sob investigação.

Entre os fatores que dificultam o combate a essas doenças estão: o controle dos vetores (extremamente adaptáveis ao meio urbano, com ovos resistentes às alterações climáticas), a falta de vacinas (a única que possui vacina é a Febre Amarela) e a similaridade dos sintomas entre as patologias. De acordo com Bárbara, outro fator importante é o diagnóstico complicado dessas doenças, devido à reatividade cruzada comum nos ensaios para detecção de anticorpos IgM e IgG, conforme já discutido em outro artigo: Dengue, Zika e Chikungunya: saiba qual é o papel dos laboratórios.

Os principais arbovírus no Brasil e os alertas à saúde pública

Durante a conferência magna do 53° CBPC/ML, conduzida pelo professor Dr. Pedro Vasconcelos – médico virologista, pesquisador, coordenador do Laboratório de Referência Nacional de arboviroses do Instituto Evandro Chagas (IEC), do qual é diretor, e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical – os congressistas foram alertados de que todas as arboviroses estão diretamente ligadas às ações causadas no ecossistema. Destacamos, a seguir,  os principais arbovírus que circulam em território nacional e as preocupações da comunidade científica em relação à saúde pública.

Dengue (DENV)

O vírus da Dengue pertence à família Flaviviridae e ao gênero Flavivirus e possui quatro sorotipos, ou seja, uma pessoa pode ser infectada pelo vírus por, pelo menos, quatro vezes, explica Bárbara. “A infecção secundária pode evoluir para a dengue hemorrágica, forma grave da doença que pode levar ao óbito”, complementa ela.

Um maior número de casos prováveis de Dengue foram registrados no Brasil nos anos de 2013, 2015, 2016 e 2019. O Ministério da Saúde alertou sobre a mudança do sorotipo em circulação no Brasil, sendo o sorotipo 2 o de maior incidência, a partir do final de 2018. Este é um fato preocupante, explica Bárbara. Como o sorotipo 2 não circulava no Brasil há algum tempo, grande parte das pessoas ainda não está imunizada frente a este sorotipo.

Zika (ZIKV)

O vírus do Zika também pertence à família Flaviviridae e ao gênero Flavivirus e possui um único sorotipo com três genótipos diferentes. Até 2015, poucos estudos eram encontrados a respeito da infecção causada por este vírus. Entretanto, entre o final de 2015 e início de 2016 foram registrados casos de nascimento de bebês com microcefalia e más-formações congênitas, devido à infecção das mães durante a gestação. A confirmação da ligação entre o vírus e a microcefalia, através da transmissão vertical, foi feita a partir de pesquisas do IEC com o reconhecimento da Organização Mundial da Saúde. Contudo, Vasconcelos alertou que a microcefalia é apenas a “ponta do iceberg”, como será mostrado a seguir neste artigo.

Chikungunya (CHIKV)

Pertencente à família Togaviridae e ao gênero Alphavirus, o vírus da Chikungunya foi isolado em 1950 na Tanzânia. Casos de Chikungunya congênita foram registrados na Colômbia, com três mortes. As manifestações clínicas nas crianças são sepse, insuficiência respiratória, miocardite e meningoencefalite. As sequelas crônicas encontradas nas mulheres são artrite reumatoide e nas crianças deficiência cognitiva.

Febre Amarela (YFV)

O vírus da febre amarela pertence à família Flaviviridae e ao gênero Flavivirus e é o único arbovírus que possui vacina. Entre 2017 e 2018, a doença ressurgiu no Brasil e levantou uma discussão a respeito da necessidade de reforço da vacina a cada 10 anos. Desde então, o país adota uma única dose da vacina durante toda a vida. A vacinação em massa da população atentou a comunidade científica para a ocorrência de reatividade cruzada com os anticorpos antifebre amarela nos testes para identificação das arboviroses devido à imunização.

Mayaro (MAYV)

Também pertencente à família Togaviridae e ao gênero Alphavirus. O vírus do Mayaro foi descoberto em 1954 e os casos registrados no Brasil estão concentrados, principalmente, na região amazônica. Em 2019, porém, foi detectada a circulação deste vírus também no Sudeste e Centro-Oeste do país.

West Nile (WNV)

Identificado pela primeira vez em 1937, o vírus do West Nile pertence à família Flaviviridae e ao gênero Flavivirus. No Brasil, foi isolado apenas em equinos no Estado do Espírito Santo. Mesmo ainda não isolado em humanos no país, este vírus chama atenção, pois pode causar necrose e apoptose de neurônios, levando ao comprometimento do sistema nervoso central.

Pesquisas incipientes – microcefalia seria apenas a “ponta do iceberg” da infecção

Durante o 53º CBPC/ML, Dr. Vasconcellos expôs que, desde o surto de Zika, há o acompanhamento  e observação do quadro clínico das crianças que residem em áreas onde houve alta incidência do vírus. A Síndrome Congênita da Zika se refere a uma série de manifestações clínicas, além das identificadas na época do surto, como a microcefalia. Ela pode estar relacionada à dificuldade de aprendizagem, epilepsia, problemas de visão, perda de audição, desordens psiquiátricas, autismo, entre outros quadros clínicos, cuja correlação com o vírus ainda não foi completamente identificada. Logo, a microcefalia seria apenas a “ponta do iceberg” dessa infecção.

Segundo o professor, casos de mulheres infectadas com o Zika e que tiveram aborto ou bebês natimortos também podem estar relacionados ao vírus. Portanto, ainda é muito superficial o conhecimento do que a transmissão vertical dessa infecção pode causar, em longo prazo, ao organismo humano.

“As arboviroses são um caso preocupante de saúde pública, com desafios, como o diagnóstico serológico complicado em razão da reatividade cruzada, a dificuldade de controle dos vetores de maneira efetiva, a identificação de novos vírus e os efeitos nos seres humanos ainda pouco conhecidos. Uma situação que exige a implantação de políticas públicas adequadas e a mobilização da população, que deve estar atenta a este problema”, completa Bárbara.

 

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